sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

O Sonho Acabou

O natal vem chegando com várias más notícias para o mercado quadrinhístico brasileiro. Rumores de que essa ou aquela editora teriam fechado circulam desde sempre - se dependesse dos boatos que eu já ouvi, a Conrad já teria falido umas cinco vezes - mas agora temos notícias oficiais.

Uma não é tão drástica: no dia 11 de Dezembro último, Cassius Medauar, o "cabeça" da Editora Pixel, anunciou no blog da editora o seu desligamento do projeto. Segundo ele, "Os rumos tomados começaram a ser bem diferentes dos planos que tínhamos no começo e eu acabei não me encaixando mais nos planos da empresa. Continuarei dando consultoria para a Pixel na parte Editorial." Obviamente ele não dá detalhes de quais seriam essas diferenças de projeto editorial, mas posso prever que ele não saiu da empresa porque ela estaria querendo ser underground em excesso. Prevejo um futuro nebuloso, sem lançamentos nacionais, sem Corto Maltese, e com novos lançamentos da Marvel e DC, ou mangás pop para crianças de 5 a 10 anos.

A notícia mais triste e drástica é o fechamento oficial da editora Opera Graphica, após 10 anos de atividades. O site da editora foi substituído por uma nota sobre o fechamento, anunciando até uma festa de despedida em São Paulo. Pena que eu não vou poder ir.

Não sei se foi a recente crise econômica que abalou as estruturas dessas e de outras editoras que publicam quadrinhos no Brasil, mas pode ter sido um golpe final, a gota d'água, o último prego do caixão. Sejamos francos: o mercado editorial no Brasil é composto basicamente por fãs do Don Quixote, que acreditam no sonho irreal de um país melhor onde as pessoas compram e lêem livros. Fato é que vivemos em uma nação onde as pessoas só lêem Dom Casmurro por causa da mini-série da Globo, compram livros baseados no que a Revista Veja anunciou, e não conseguem nem entender direito os livros do Paulo Coelho. Quadrinhos, então, nem pensar: Mônica e Cebolinha, OK, fora isso, é coisa de retardados.

Mudar essa mentalidade é difícil, mas eu admiro quem tente. Mas acho os métodos pouco eficazes. Vender um produto cultural, no Brasil, se restringe a lançá-lo para uma minoria de gente que 1. se importa com adquirir cultura 2. tem dinheiro para gastar com isso e 3. procura coisas novas para ler, ao invés de apenas obedecer o que mandam a Veja e o Jô Soares.

Uma forma de mudar isso seria ir direto nas bases: toda criança gosta de ler quadrinhos, mas a partir de certa idade elas começam a relacionar seus gibis com a imaturidade, e decidem jogá-los fora junto com a fantasia do Batman e os brinquedos (exceto a bola de futebol, essa é coisa de adulto!). Ações de "marketing do bem" direcionadas a essas crianças para que continuem lendo quadrinhos adultos são vitais para a indústria.

Outra coisa importante é o preço do produto. Os gibis americanos que vendem na casa das 100.000 unidades custam lá 3 dólares. Aqui no Brasil um gibi semelhante, impresso em papel inferior, custa entre 10 e 15 reais. Os álbuns do Corto Maltese da editora Pixel custavam quase 40 reais. Na terra do Paulo Coelho e do Código Da Vinci, quem é que paga 30 reais em um gibi preto-e-branco e desconhecido. Só se o Jô Soares mandasse mesmo.

Jô Soares esse que adora quadrinhos mas raramente toca no assunto em seu programa. Se ele fosse abordado por essas editoras para, por exemplo, convidar quadrinistas brasileiros para ir até o programa dele mostrarem o trabalho, e coisas assim, garanto que ia ser outra coisa. Mas aparentemente as editoras de quadrinhos brasileiras estão ocupadas demais lançando mangás para pensar em uma estratégia de marketing diferente. Jogar os produtos em bancas e torcer para eles serem vendidos não funciona. O mercado editorial, brasileiro ou de qualquer outro país, não é uma pescaria.

O mais importante de tudo é mudar a visão que o público geral tem dos quadrinhos. Mostrar para o Brasil inteiro que existem quadrinhos adultos dos mais variados, e acabar de vez com essa maldição que cerca essa forma de arte tão estranha, incompreendida, mal estudada, usurpada, imitada, distorcida, ignorada e maravilhosa.